O capítulo “A Lição
de Violão” propõe revelar o major Quaresma aos leitores. Ele é um homem
reservado e engajado na valorização do seu país. Todavia, isso é de forma
exacerbada, levando-o a propor a substituição da língua portuguesa pela
tupi-guarani.
Elementos que demonstram a sua supra valorização pelos
elementos nacionais:
·
A coleção de livros sobre assuntos da nação;
·
As aulas de violão e modinha;
·
A defesa do tupi-guarani como língua oficial da
nação;
A crítica que o livro traz é a valorização de elementos
estrangeiros em detrimento dos elementos nacionais. Isso torna-se claro através
da conversa de Policarpo com Ricardo Coração de Leão, quando ele diz:
- É porque é de leite, se fosse como essas estrangeiras aí,
fabricadas com gorduras de esgotos, talvez não se estragasse... É isso Ricardo! Não querem nada da nossa
terra...
- Em geral é assim – disse Ricardo.
- Mas é um erro... Não
protegem as indústrias nacionais... Comigo não há disso: de tudo que há
nacional, eu não uso estrangeiro [...]
O capítulo “Reformas
Radicais” revela que Policarpo já detinha conhecimento o suficiente para
propor a sua própria teoria, como será visto mais à frente. Além disso, busca
revelar quem é o general Albenaz.
Na sua tentativa de retratar o povo brasileiro, Lima Barreto
começa a introduzi as pessoas do subúrbio do Rio de Janeiro, personagens que se
tornaram um diferencial nas suas obras, como também o uso da linguagem oral. No
primeiro capítulo, trouxe Ricardo Coração dos Outros, agora ele traz Maria
Rita, “uma velha preta”. O interessante é que ele retrata a ida de Quaresma e
Albenaz até a residência dela, no subúrbio.
Através dessa personagem, pode-se perceber que a época em
que foi retratado essa história foi após o fim da escravidão. Maria Rita era
uma ex-escrava. Vale adiantar que o período retratado foi do governo do
marechal Floriano Peixoto. Ainda com essa personagem, Lima Barreto busca
transmitir que a cultura africana trazida pelos escravos, agora faz parte da
cultura brasileira, isso porque o major Quaresma apoia a ida do general Albenaz
até a senhora para obter algumas canções cantadas pelos escravos.
Algo interessante, que busca trazer a valorização da cultura
de um povo é o que está escrito logo após o a senhora Rita esquecer o trecho da
música Bicho Tutu:
“Os dois saíram tristes.
Quaresma vinha desanimado. Como é que o povo não guardava as tradições de
trinta anos passados? Com que rapidez morriam assim na sua lembrança os seus
folgares e as suas canções? Era bem um sinal de fraqueza, uma demonstração de
inferioridade diante daqueles povos tenazes que os guardam durante séculos!
Tornava-se preciso reagir, desenvolver o culto das tradições, mantê-las sempre
vivazes nas memórias e nos costumes...”
Isso é um alerta ao povo brasileiro. Lima Barreto está
dizendo “preserve a sua cultura, as suas
tradições, não as deixem serem suplantadas pelas demais.” Na
contemporaneidade, vemos a busca pela exaltação da cultura negra no Brasil.
Isso é um bom sinal, pois há pessoas que estão tentando resgata-la nos dias
atuais.
Em seguida, Lima Barreto
traz um personagem que traduz o que ele quer transmitir. Esse personagem era “[...] um velho poeta que teve sua
fama ai pelos setenta e tantos, homem doce e ingênuo que se deixara esquecer em
vida, como poeta, e agora se entretinha em publicar coleções que ninguém lia,
de contos, canções, adágios e ditados populares.”
Algo interessante a ser notado é que o senhor era um autor
ignorado pelo público. Leia: “ ... e
agora se entretinha em publicar coleções que ninguém lia, de contos, canções,
adágios e ditados populares.” Isso demonstra o desprezo pela cultura popular da época, como
também da cultura nacional.
Nesse capítulo, surge dois novos personagens, o compadre Vicente,
um italiano e a filha de Vicente, Olga. Esse personagem é interessante, pois
nos remete a leva de imigrantes que vinheram ao Brasil durante o período da
República do Café com Leite. Devemos lembrar que mesmo após o fim da
escravidão, o preconceito continuava a reinar. Por isso, foi estimulado a vinda
de emigrantes para serem mão de obra e, principalmente, para “branquear” a
nação.
Por fim, qual a mudança radical sofrida por Quaresma? A transformação
foi o engajamento com que ele vem tratando as questões nacionais. Ele
demonstra-se mais decidido em lutar pela valorização da cultura nacional. Como
foi descrito no final do capítulo: “E os dois
ainda discutiram acaloradamente diante da moça, surpresa, espantada, sem
atinar, sem explicação para aquela inopinada transformação de gênio do seu
padrinho, até ali tão sossegado e tão calmo.” Isso
ocorreu quando Quaresma discutia com Ricardo sobre instrumentos musicais.
O capítulo
A Notícia do Genelício, Lima Barreto
aborda a posição social da mulher em relação ao casamento. Ele faz inúmeras
observações as quais indicam que a o casamento nesse período não ocorria por
amor, mas por obrigação. Leia o que ele diz:
“A todo instante e a toda hora,
lá vinha aquele — "porque, quando você se casar..." — e a menina foi
se convencendo de que toda a existência só tendia para o casamento. A
instrução, as satisfações íntimas, a alegria, tudo isso era inútil; a vida se
resumia numa coisa: casar.”
“A vida, o mundo, a variedade
intensa dos sentimentos, das idéias, o nosso próprio direito à felicidade,
foram parecendo ninharias para aquele cerebrozinho; e, de tal forma casar-se se
lhe representou coisa importante, uma espécie de dever, que não se casar, ficar
solteira, "tia", parecia-lhe um crime, uma vergonha.”
“De natureza muito pobre, sem
capacidade para sentir qualquer coisa profunda e intensamente, sem quantidade
emocional para a paixão ou para um grande afeto, na sua inteligência a idéia de
"casar-se" incrustou-se teimosamente como uma obsessão.”
Mais à
frente na leitura, veremos que Ismênia, a noiva que serve de base para a
argumentação de Lima, não se importava com o casamento:
“Ela [mãe de Ismênia]
arrumava a mesa, nervosa e alegre; e a filha fria e indiferente.”
Contexto:
Preparação para a festa de noivado
“A Ismênia era a menos
entusiasmada, quase não respondia às perguntas; e, se as respondia, era por
monossílabos. Houve um momento em que sorriu quase com alegria e abandono.”
Contexto:
Durante a festa de noivado
Outro
ponto trabalhado por Lima Barreto, foi a supra valorização de quem era formado.
Naquele período, não era comum cursar a faculdade, somente aqueles que tinham
condição para tal, normalmente os filhos dos mais abastados. Todavia,
Cavalcânti, o personagem que representa tais pessoas, era diferente. Ele
aparenta não ter condições para cursar Odontologia, isso porque demora muito
para se formar, como também, sempre pedi auxílio financeiro ao pai de sua
noiva. Contudo, disse sobre ele o seguinte:
“Para aquela gente toda,
Cavalcânti não era mais um simples homem, era homem e mais alguma coisa sagrada
e de essência superior; e não juntavam à imagem que tinham dele atualmente, as
coisas que porventura ele pudesse saber ou tivesse aprendido. Isto não entrava
nela de modo algum; e aquele tipo, para alguns, continuava a ser vulgar, comum,
na aparência, mas a sua substância tinha mudado, era outra diferente da deles e
fora ungido de não sei que coisa vagamente fora da natureza terrestre, quase
divina.”
Sobre os
militares, Lima escreveu o seguinte: “É curiosa essa coisa das
administrações militares: as comissões são merecimento, mas só se as dá aos
protegidos,”
E por fim, acerca de estudo,
demonstrou que muitos na época tinham um pensamento incorreto:
“—Pra que ele lia tanto?
indagou Caldas.
—Telha de menos, disse
Florêncio.
Genelício atalhou com
autoridade:
—Ele não era formado, para que
meter-se em livros?
—É verdade, fez Florêncio.
—Isto de livros é bom para os
sábios, para os doutores, observou Sigismundo.”
No capítulo Desastrosas Consequências de um
Requerimento, Lima chama-nos a atenção
para a emancipação cultural do Brasil. Isso é visto pela proposta de
Policarpo.
Policarpo
Quaresma propôs a adoção da língua tupi-guarani como oficial: “Policarpo Quaresma,
cidadão brasileiro, funcionário público, certo de que a língua portuguesa é
emprestada ao Brasil [...]
usando do direito que lhe confere a Constituição, vem pedir que o
Congresso Nacional decrete o tupi-guarani, como língua oficial e nacional do povo brasileiro.”
Algo
importante a se salientar, é um argumento de Quaresma: “[...] a emancipação política do país
requer como complemento e consequência a sua emancipação idiomática.”
Pode-se
entender nessa ocasião que um complemento da emancipação política é a
emancipação cultural.
Não
devemos nos isolar e ignorar a cultura dos demais povos, achando que a nossa é
a superior, pois nos tornaríamos etnocêntricos. Mas o que é ser etnocêntricos?
São povos ou pessoas que acham que a sua cultura é a superior entre as demais.
Por exemplo, os povos europeus, no período das Grandes Navegações, começou a
anular a cultura dos demais povos que eles encontravam, afirmando que eram
comportamento de “selvagens” ou de “incivilizados”. Por isso, começaram a impor
a sua cultura sobre as dos demais, o que acarretou em sérios estigmas, como que
os indígenas são preguiçosos, quando na
verdade, o estilo de vida deles era diferente do português.
Todavia,
não devemos desprezar a nossa cultura. Ela é rica, e devemos aproveita-la.
Portanto,
nós devemos respeitar tanta a cultura nacional quanto as dos demais. Não
supravalorizar, mas respeitar.
No
capítulo Bibelot¸ Lima Barreto faz
uma reflexão sobre a loucura e o hospício. Ele já ficou num hospício, talvez
por isso ele tenha tratado desse tema no seu livro. O personagem que foi para
esse local foi Quaresma. Quaresma foi mandado para lá após o oficio que ele
escreveu em tupi.
Outra
crítica que ele faz, é ao casamento. Barreto traz o casamento como um evento
que ocorria porque tinha que ocorrer. Não
era por amor, mas porque todas faziam isso.
“—Gostas muito dele? indagou o
padrinho.
Ela não sabia responder aquela
pergunta. Queria sentir que gostava, mas estava que não. E por que casava? Não
sabia... Um impulso do seu meio, uma coisa que não vinha dela — não sabia...
Gostava de outro? Também não.”
“Casava por hábito de
sociedade, um pouco por curiosidade e para alargar o campo de sua vida e aguçar
a sensibilidade.”
Os
resquícios da escravidão e do racismo também são tratados nesse capítulo.
Quando
Coleoni encontra uma senhora afrodescendente, ela se dirige a ele da seguinte
forma:
“—Ah! meu sinhô!... É
triste...”
O termo sinhó era
utilizado pelos escravos para se referir ao seu dono.
E à filha:
“—Antes fosse, sinhazinha.”
Sinhazinha é outro termo que
nos remete ao período da escravidão.
Deve-se
salientar que essa história foi publicada, primeiramente, em 1911, em forma de
folhetim, portanto 27 anos após a abolição da escravatura.
Em relação
ao racismo da época, temos:
“Não é que ele [Ricardo] tivesse
ojeriza particular aos pretos. O que ele via no fato de haver um preto famoso
tocar violão, era que tal coisa ia diminuir ainda mais o prestígio do
instrumento. Se o seu rival tocasse piano e por isso ficasse célebre, não havia
mal algum; ao contrário: o talento do rapaz levantava a sua pessoa, por
intermédio do instrumento considerado; mas, tocando violão, era o inverso: o
preconceito que lhe cercava a pessoa, desmoralizava o misterioso violão que ele
tanto estimava.”
AUTOR: DANIEL GOMES
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