No
capítulo O “Sossego”, Lima Barreto
continua a sua análise sobre a loucura, e traz a loucura como um estado de
incorporação. Segundo o autor, no trecho abaixo, para algumas culturas, a
loucura é um estado em que uma entidade toma posse do indivíduo, dessa forma, é
ela que o rege. Leia o trecho a seguir.
“Aquela continuação da nossa
vida tal e qual, com um desarranjo imperceptível, mas profundo e quase sempre
insondável, que a inutiliza inteiramente, faz pensar em alguma coisa mais forte
que nós, que nos guia, que nos impele e em cujas mãos somos simples joguetes.
Em vários tempos e lugares, a loucura foi considerada sagrada, e deve haver
razão nisso no sentimento que se apodera de nós quando, ao vermos um louco
desarrazoar, pensamos logo que já não é ele quem fala, é alguém, é alguém que
vê por ele, interpreta as coisas por ele, está atrás dele, invisível!...”
Através
dessa nova fase da vida de Quaresma, Lima busca atacar novamente a sociedade vigente.
Quaresma encontra-se num sítio chamado Sossego. Ele pretende viver da
agricultura agora. Essa ideia veio de Olga. Ele logo aceitou o concelho e
fundamentando-se que as terras do Brasil são as mais férteis do mundo, buscou
Comprar um
sítio.
A crítica
é acerca da supra valorização da vida urbana em detrimento da vida rural. Isso
fica claro em:
“Ele foi contente. Como era tão
simples viver na nossa terra! Quatro contos de réis por ano, tirados da terra,
facilmente, docemente, alegremente! Oh! terra abençoada! Como é que toda a
gente queria ser empregado público, apodrecer numa banca, sofrer na sua
independência e no seu orgulho? Como é que se preferia viver em casas
apertadas, sem ar, sem luz, respirar um ambiente epidêmico, sustentar-se de
maus alimentos, quando se podia tão facilmente obter uma vida feliz, farta,
livre, alegre e saudável?"”
Essa
atitude lembra o fugere urbem
promovido pelo Arcadismo.
Ele usa
esse capítulo para exaltar a natureza presente no Brasil.
No
capítulo Espinhos e Flores, Lima
começa a descrever como foi o processo de urbanização do Rio de Janeiro. Ele
descreve também o subúrbio das cidades,
focando nos cortiços, prédios em que famílias pobres dividiam um cômodo com
outras.
O mais
famoso cortiço do Rio de Janeiro era chamado de Cabeça de Porco. Ele e inúmeros
outros cortiços foram demolidos durante uma operação de higienização do Rio. O
prefeito da época, Barata Ribeiro, acreditava que esses locais eram insalubres
e por isso mandou demoli-los. Todavia, ele não concedeu uma residência aos
antigos cidadãos desses locais. Por
isso, eles foram se instalar nos morros, destacando-se o Morro da Providência.
Disso, começa a surge as primeiras favelas no Brasil.
A novela
Lado a Lado demonstra esse processo.
Mais a
diante, Lima Barreto retorna a exaltar a cultura nacional. Durante a festa de
casamento de uma das filhas do general Albenaz, Quinota, Ricardo Coração dos
Outros toca seu uma modinha com o seu violão, e é amplamente aplaudido.
Todavia, a filha de Lemos, que cantou uma romanza
italiana com um piano,
não teve tanto louvor.
No
capítulo Golias, Lima Barreto retoma
a crítica ao casamento, focando o casamento por obrigação: “Continuava a
não encontrar dentro de si motivo para aquele ato, mas, aparentemente, nenhuma
vontade estranha à sua influíra para isso.”; e
casamento por interesse: “O marido é que estava
contente... Ficando rico e sendo médico, cheio de talento nas notas e
recompensas escolares, via diante de si uma larga estrada de triunfos nas
posições e na indústria clínica.”
Outro
ponto que ele traz, é o contexto histórico em “A antiga chamava-se Marechal
Deodoro, ex-Imperador; e a nova, Marechal Floriano, ex-Imperatriz.” Ele está se
referindo ao período da República da Espada, época em que os marechais Deodoro
da Fonseca e Floriano Peixoto governaram o país.
A
utilização da linguagem oral fica evidente na conversa entre Felizardo, um novo
empregado de Quaresma, e seu patrão. Essa é uma característica importante da
obra de Lima Barreto. Foi essa característica que o destacou, e que serviu de
inspiração para a primeira geração modernista.
Outro
ponto trabalhado é a não participação política dos cidadãos mais pobres. Isso fica
claro com a fala de Felizardo:
“—E você, por quem é? [diz
Quaresma]
—Eu! Sei lá... Urubu pelado não
se mete no meio dos coroados. Isso é bom pro "sinhô". [diz
Felizardo]”
Mas
também, é estranho a posição de Quaresma em não querer participar da política.
Comumente, homens que estudam compreendem a importância da política para a
nossa vida, logo querem atuar. Todavia, ele é diferente, ele não deseja
participar da política.
Essa
negligência em participar da politica tem afetado o Brasil até os dias atuais.
A população tem deixado isso a cargo dos mais estudados e dos mais endinheirados,
isso faz com que os interesses dessas classes sejam ouvidos em detrimento das
demais. Além disso, sem a participação popular, não havia tanta vigilância e
cobrança sobre os deputados, senadores e outros, fazendo com que os casos de
corrupção se tornassem comuns.
Em “Peço Energia, Sigo Já”, Lima
Barreto faz uma crítica a população mais
pobre. A sua crítica é a falta de união que essa camada tem. Isso recorda a
celebre frase, “proletariado, unir-vos”. Todavia, essa população não teve
educação adequada, logo haverá dificuldades para eles se organizarem.
Devemos
lembrar que os chefes da Revolução Russa, foram homens que tinham formação, que
tinham estudo. Portanto, para haver alguma mudança, é necessário que pessoas
tais quais os chefes da revolução de 17 ajam.
Em
seguida, Lima Barreto levanta uma crítica ao projeto migratório produzido pelo
governo. Ele questiona “...estúpido ou de má-fé era o Governo que os andava
importando aos milhares, sem se preocupar com os que já existiam.”
Deve-se
recordar que naquele período, o Brasil vivia uma onda migratória incentivada
pelo Estado. Isso foi uma tentativa de branquear o Brasil. Aumentar o número da
população branca em nosso país para que ele se assemelhasse aos países
europeus.
Algo
importante a ser destacado, é a referência à insumos agrícolas americanos.
Produtos como arados mecânicos, semeador e outros produzidos pelos Estados
Unidos. Isso indica que vivemos o período da Segunda Revolução Industrial,
quando a revolução sai da Inglaterra e estende-se para a Europa, Japão e EUA.
Outra
crítica Lima Barreto faz. Ele dirige-se aos políticos, que usam os seus cargos
para benefícios pessoais. Entenda benefícios pessoais como manobras que o
favoreça, ou que desfavoreça um adversário. Isso ocorre quando Quaresma é
intimado pelo governo municipal a capinar e limpar a estrada a uma extensão de
1200 metros. Isso foi uma vingança do doutor Campos por ele não querer
participar da política local.
Em
O Trovador, Lima Barreto retorna a crítica
o governo. Leia uma parte da fala de Albenaz: “Um país como este, tão rico, talvez o mais rico do mundo, é, no
entanto, pobre, deve a todo mundo... Por quê? Por causa dos governos que temos
tido que não têm prestígio, força... É por isso.”
Ele nos remete à divida externa do Brasil. O
país devia à Inglaterra porque Portugal esse pediu uma indenização de 2 mil
réis por causa da independência da sua colônia.
O país não tinha dinheiro para pagar, pois D.
João VI, quando retornou para Portugal, levou uma quantidade considerável de
dinheiro do banco nacional.
Continuando a leitura da conversa entre
Albenaz e Caldas, é possível verificar o período histórico no qual essa estória
ocorreu. O período é da República da Espada.
Posteriormente, quando Albenaz e Caldas
encontram um soldado dormindo, começasse a discutir uma das fases desse período
histórico, que foi a Segunda Revolta da Armada.
A Segunda Revolta da Armada propunha a
convocação de eleição presidencial. Para melhor entendimento, é necessário
fazer uma retrospectiva. O marechal Deodoro da Fonseca tinha renunciado à
presidência graças a pressão exercida pela Primeira Revolta da Armada. Assumiu,
então, o vice-presidente marechal Floriano Peixoto. Todavia, esse governo era
interino. Portanto, seria necessário convocar novas eleições, o que o marechal
não pretendia. Por isso houve a Segunda Revolta da Armada. Ela, entretanto, não
obteve sucesso.
Criticou o governo, afirmando que ele era
autoritário, leia: “Bastava a mínima critica, para
se perder o emprego, a liberdade, — quem sabe? — a vida também.”
Posteriormente, Lima Barreto criticará o positivismo,
ideal que regia o exército brasileiro. “Eram os adeptos desse nefasto e
hipócrita positivismo, um pedantismo tirânico, limitado e estreito, que
justificava todas as violências, todos os assassínios, todas as ferocidades em
nome da manutenção da ordem...”
Depois, ele redireciona as suas críticas às
pessoas que se fingem ser doutoras. Isso ocorre através da pessoa de Armando
Borges, o marido de Olga. Ele fingia ser interessado pela ciência, mas não era.
Quando Olga descobriu isso, gerou uma insatisfação tal, que teve desgosto do
marido. Dessa forma, crítica os casamentos por interesses novamente.
Todavia, retorna de forma magistral ao assunto
da rebelião após a conversa entre Olga, seu marido e seu pai:
“Os governos,
com os seus inevitáveis processos de violência e hipocrisias, ficam alheados da
simpatia dos que acreditam nele; e demais, esquecidos de sua vital impotência e
inutilidade, levam a prometer o que não podem fazer, de forma a criar
desesperados, que pedem sempre mudanças e mudanças.”
Autor: Daniel Gomes
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